quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Porque respondo SIM

Votar sim é a oportunidade de terminar com a criminalização da interrupção voluntária da gravidez (I.V.G).
Esta será a consequência de maior visibilidade no momento de vitória do sim no próximo dia 11. Mas não será a única consequência importante.

Votar sim é permitir ao "outro" cumprir, dentro de um regime de legalidade, com as decisões que toma em consciência. Neste caso é não arrogar o direito de votar para decidir por terceiros numa matéria que é do foro íntimo da mulher, no máximo, do casal.

Acabar com a penalização da I.V.G. corresponde ao fim do véu da ilegalidade que condiciona de forma negativa a decisão. Entenda-se; despenalizar é permitir, à mulher, num momento difícil e de grande fragilidade, recorrer ao aconselhamento médico sem temer o jugo de uma lei que a penaliza criminalmente. Despenalizar é contribuir para uma decisão ainda mais ponderada.

Despenalizar é contribuir, de uma forma decisiva, para o debelar de um problema de saúde pública. Um problema que ganha forma através dos números que todos conhecemos.
A I.V.G. que não é medicamente assistida aumenta o risco de lesões físicas e psíquicas para a mulher. Os casos de morte acontecem e não podem ser ignorados.

A I.V.G. não é um método contraceptivo. Não é um acto leviano. É uma decisão que requer as melhores condições para que possa ser tomada em consciência.

Pequenos Apontamentos: Comunicação Social - Adopção - Consciência

Nas últimas semanas, o país tem vindo a ser bombardeado pelos meios de comunicação social com constantes notícias relativas ao caso do sargento Luís Gomes, o homem que adoptou uma criança, e, vendo-se em risco de a perder para o pai biológico – agora reclamador da sua tutela – resolveu levá-la para paradeiro desconhecido e mantê-la escondida da justiça.

Face à tamanha quantidade de informação disponibilizada sobre o caso, tem-me ocorrido, por diversas vezes, se todo este aparato, exactamente durante o período de pré-campanha e campanha para o referendo sobre a IVG, será por acaso. Claro que havendo ou não havendo referendo, o caso seria, de qualquer forma, tratado pela justiça e falado na comunicação social. Porém, tendo em conta o facto de corresponder a esta fase fulcral da discussão sobre a IVG, pode estar a ser usado para influenciar a decisão no referendo a favor do Não. De facto, a mensagem que passa é a de que vale sempre a pena levar a gravidez até ao fim mesmo que a mãe ou a família não tenham condições para ter uma criança, pois haverá sempre uma “alma caridosa” que tratará dela e a defenderá como se fosse biologicamente sua filha.

É uma verdade que alguns destes casos terminam bem. Não duvido que a filha adoptiva do sargento Gomes esteja em boas mãos. O problema é que esta não é a regra. Nem sequer imagino a quantidade de crianças que aguardam por adopção fechadas em estabelecimentos de acolhimento, muitos deles de qualidade duvidosa, verdadeiras escolas de marginalidade, em todos os sentidos da palavra. Terão que esperar muito tempo e muitos nunca chegarão a ser adoptadas. E, depois? quando passarem daquela idade em que deixam de ser suficientemente “engraçadinhos” para interessarem aos casais que optam pela adopção? O que será deles? Será que é com pessoas destroçadas desde a infância por sentimentos de rejeição, abandono, baixa auto-estima, más condições de vida, marginalidade e muito mais, que se pretende “repovoar” o país como os defensores do Não clamam que é necessário fazer? Ou será que esse objectivo não seria mais bem conseguido incentivando a natalidade entre as famílias estruturadas e capazes de proporcionar um bom futuro às suas crianças?

Os defensores do Não dizem que a sua consciência não lhes permite aceitar que se destrua o que chamam de “ser humano” ao evitar que este se desenvolva e nasça. A minha não me permite aceitar que se destrua um verdadeiro ser humano, com consciência, razão e sentimentos, na tortura lenta e degradante de uma vida condenada à nascença.

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Respondo Sim

«Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»

Esta é a questão que será referendada no próximo dia 11 de Fevereiro. Sim ou não? Nada mais.

Somos, ou não somos, favoráveis à despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (I.V.G.), se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas? Concordamos, ou não concordamos, que uma mulher que decida praticar uma I.V.G. seja assistida num estabelecimento de saúde devidamente autorizado?
Sim ou não?

O que será alvo de referendo no próximo dia 11 de Fevereiro é uma proposta de alteração ao código penal.

Não será alvo de referendo no próximo dia 11 de Fevereiro nenhuma lei moral.
Estejamos certos disso.

Realidade vs Idealismo

Pegando um pouco na ideia que o Ricardo expôs no seu post anterior, gostaria de focar sucintamente um dos pontos em que todos deveríamos insistir durante e após este período de intensa discussão: prevenção. Este ponto de reflexão tem como objectivo focalizar apenas um dos pontos de vista que estão em discussão. Fala-se bastante em prevenção e em planeamento familiar.

É certo que existe à disposição de muitas mulheres e respectivas famílias toda uma panóplia de elementos que permitem evitar uma gravidez indesejada. Mas também é certo que essa informação não vai ter com essas pessoas, na maior parte das vezes o contacto é feito no sentido oposto, o que pressupõe algum tipo de desejo de obter mais informação a partir do pouco que já se tem.

Sabemos que a falta de informação, conjuntamente com um acesso restrito à escolaridade desejável e com dificuldades prementes de uma vida prática e real, afectam, sobretudo, mulheres e homens que não são totalmente privilegiados.

E aí entra o conflito entre o mundo ideal e o mundo real. Esse tipo de planeamento nem sempre é feito ao mesmo ritmo que a urgência das vidas reais e temos de ter a honestidade de admitir que o recurso à interrupção voluntária da gravidez é uma realidade que, muitas vezes, não conhecemos de perto e que, como tal, preferimos admitir que não é tão grave como isso. Mas é.

Cátia Santos

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

O que está em causa

No referendo que se aproxima rapidamente, estará em causa uma das questões mais basilares para todos os seres humanos desde o despertar da humanidade: liberdade.
Mais especificamente a liberdade de cada mulher, não isolada do meio em que está inserida nem afastada da rede de relações humanas em que se inscreve, poder optar entre ter um filho que deseja ou não o ter porque não pode ou não deseja.

Alegar que a actual lei é suficiente não passará de demagogia e irrealidade. Se for a minha vontade, como mulher que sou, interromper voluntariamente a minha gravidez - não tendo sido violada, nem prevendo a existência de mal-formações do feto - só o poderei fazer recorrendo a meios ilegais. Como uma criminosa, como uma clandestina no meu próprio país, tratada como uma cidadão de segunda. É disso que se trata.

Se existe quem defenda a inconstitucionalidade da nova lei, caso venha a ser aprovada, por atentar contra a sacralidade da vida, que dizer do atentado à vida da mulher? A realização de um aborto nas condições que muitos de nós conhecem - e que eu própria conheço de muito perto - põem, obviamente, em causa a vida da mulher. A negação de cuidados de saúde e de apoio nessa altura a essas mulheres não constitui também um atentado?

É, logicamente, muito difícil para uma mulher decidir-se pelo aborto. Não é algo que se decida de forma leviana e que seja visto como facilitismo. Mas sejamos realistas: a vida prática de muitas mulheres não é um mar de rosas e é a vida prática que é vivida, não o absolutismo de alguns ideais.

Decididamente, não podemos ou não devemos julgar os outros segundo a nossa própria medida, a votação de dia 11 representa também a nossa capacidade de nos deslocarmos do nosso centro gravitacional e colocarmo-nos nas vidas de mulheres (e homens) que, possivelmente, não vivem como nós. E colocarmo-nos na nossa própria vida e sermos honestos connosco.

Cátia Santos

domingo, 28 de janeiro de 2007

Por uma vida que valha a pena viver

Sou pelo “sim” à despenalização da interrupção voluntária da gravidez. É uma questão de defesa da vida, de respeito pelo ser humano. Esta afirmação pode parecer estranha para aqueles que defendem o “não”, mas estou convicto de que corresponde à verdade. Isto porque a vida só vale a pena ser vivida se o for com o mínimo de dignidade, o que é válido, neste caso específico, tanto para as mulheres, como para as crianças. A vida apenas pela vida, pelo simples facto de um coração bater não me parece fazer nenhum sentido.

Permitam-me que me explique melhor. Para mim, só vale a pena trazer uma criança ao mundo se lhe pudermos dar uma vida decente. De outro modo, não vale a pena. Só lhe causaríamos sofrimento, ao qual se juntaria, ainda, a dor da própria mãe e familiares, incapazes de lhe proporcionar as condições de vida ideais. Não falo dos fetos com malformações, pois é uma situação que já está prevista na lei actual, mas das crianças que, se nascerem, terão um destino marcado com a palavra “Miséria”. Para começar, miséria económica, que se encontra quase sempre associada à miséria social: desemprego, exclusão, mau ambiente familiar, habitações precárias, falta de condições higiénicas. Depois, o que daqui naturalmente advém: doença, violência, marginalidade, desinteresse pela educação. A despenalização da interrupção voluntária da gravidez pode salvar muitas crianças de destinos como este e muitas mães de agravarem a sua já precária condição.

Haverá quem diga que estes não são argumentos válidos, pois o Estado devia ajudar as famílias mais desfavorecidas para que as crianças por nascer pudessem ter melhores perspectivas de vida. É verdade que tal devia acontecer, mas para já, é uma proposta destinada a um mundo ideal. No mundo real, em que nós vivemos, e, sobretudo, em Portugal, um país que se debate com sérias dificuldades económicas, isso é impossível. O Estado não tem capacidade financeira para poder ajudar os vivos muito menos os que estão por nascer. É triste, mas é a realidade e é a partir dela que temos que pensar o assunto.

Há ainda quem clame que, se o Estado não pode ajudar essas famílias, porque é que está disposto a gastar dinheiro em abortos? Não nos iludamos. O dinheiro gasto pelo Estado para pagar um aborto, caso fosse entregue às famílias, não daria para suportar os custos de alimentação, saúde, educação, etc, de um filho. Aliás, o custo de um aborto não equivale nem a um dia de despesas na vida de uma criança. Umas quantas embalagens de fraldas e o dinheiro rapidamente desapareceria.

Porém, não defendo a despenalização da interrupção voluntária da gravidez apenas devido aos casos de falta de condições socio-económicas, embora os considere prioritários. Existem mulheres que, tendo uma situação boa ou mediana nesses campos, podem engravidar e sentir que a altura não é a melhor para ter um filho, por razões profissionais ou meramente pessoais. Pode parecer egoísmo, e não duvido que possam existir algumas situações em que o seja, mas se pensarmos melhor, será que obrigar uma mulher que não se sente preparada a ter um filho será benéfico para ele? Não me parece. Muito menos para ela. Raramente um trabalho forçado tem bons resultados.

Mais uma vez é fácil para certas vozes levantarem-se contra afirmações como estas e apresentarem-nos o argumento da prevenção. Estou de acordo com a prevenção. Mesmo que a despenalização da interrupção voluntária da gravidez ganhe, acho que se deve continuar a apostar nela. Todavia, coloca-se aqui, mais uma vez, a questão do mundo real vs mundo ideal. Num mundo ideal, a prevenção resolveria tudo: informavam-se as mulheres, explicando-lhes todos os cuidados a ter e elas cumpririam todas as indicações à risca. Porém, no mundo real, a racionalidade humana facilmente vacila, as emoções do momento nem sempre são controláveis e as coisas acontecem. Se assim é, o que fazer quando acontecem? Já vimos anteriormente que ter um filho e esperar por ajudas estatais ou outras não é a solução. A interrupção voluntária da gravidez é a solução quando tudo o resto falha, apenas quando tudo o resto falha e, como todos sabemos, falha muito.

No fundo, penso que o que está em causa neste referendo podia ser resumido à expressão “defesa da vida”, mas à defesa de uma vida com direitos, com dignidade, com felicidade e com oportunidades para mulheres e crianças, contra os que defendem a mera vida pela vida, a vida sem sentido, sem futuro.

No referendo da interrupção voluntária da gravidez devemos votar “sim”, por uma vida que valha a pena viver.

Por um voto pelo SIM.

A proximidade do início da campanha para o referendo do próximo dia 11 de Fevereiro exige a mobilização de todos, sem excepção, de modo a que a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (I.V.G.) seja uma realidade.
A clandestinidade em que é feita a I.V.G tem de acabar. Esta ilegalidade tem de terminar.
Não podemos continuar a permitir que num momento de sofrimento as mulheres se encontrem privadas da devida assistência médica, sendo a face, por todo o país, de um problema de saúde pública que urge resolver. Que temos a obrigação de resolver! Porque aquilo que é um direito encontra-se, neste momento, sonegado por uma lei que tem de ser revogada e que apenas silencia o sofrimento de quem é alvo desta discriminação.
Este é o momento de votarmos contra a hipocrisia que representa a criminalização das mulheres que fazem uma I.V.G.
Esta é, também, uma questão de respeito pelo outro. Respeito pela capacidade de cada um decidir, em consciência, o que entende ser melhor. Votar sim é contribuir para que o outro tenha autonomia legal para decidir. É contribuir para que muitas mulheres tenham direito a dignidade.
Por tudo isto, é dever de todos os que defendem a despenalização da I.V.G. colaborar para a mobilização dos partidários do SIM em busca de um resultado no referendo que, finalmente, consiga proporcionar a dignificação completa da vida da mulher e da criança.

Desta vez não podemos faltar.

PELO SIM.


Cátia, Jorge, Ricardo.