segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

Valeu a Pena

Em Portugal, venceu o SIM. São sinais dos tempos que mudam, talvez. Uma boa notícia para o país, uma boa notícia para a liberdade, uma boa notícia apesar da elevada abstenção. Mas sente-se a mudança, sente-se a vontade e, só por isso, valeu a pena este debate aceso e este referendo. O país pôde discutir, pôde viver intensamente e o voto progressista venceu. Acredito neste Portugal.

sábado, 10 de fevereiro de 2007

A demagogia como prova de incoerência.

Nos últimos dias temos visto a grande campanha pela vida dinamizada por movimentos, partidos políticos e igreja.

Já todos percebemos que para o não a questão está mal formulada (aprovam a pergunta mas como não lhes tem sido de grande conveniência passaram considerar a questão mal formulada) e que o importante é defender a vida.

Dizem-se pela vida!!!

Dizem que às dez semanas “já bate um coração”…
Alguns desses demagogos esquecem-se de que a actual lei permite matar o feto que tantos defendem. Esquecem-se, esses hipócritas, que a actual lei permite a I.V.G., por exemplo, em caso de violação.

Será que na teoria do não o fruto de uma violação não representa uma vida? Porque não falam desses casos?

Para os defensores do não existem vidas mais importantes do que outras?

Se consideram que um feto com dez semanas é uma vida, e que a sua defesa é de interesse superior, como podem permitir excepções?

Afinal, onde reside a coerência desse vosso discurso?

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Espalhem a Notícia

Acabo de receber, por vários amigos, a notícia:
Um "blogue do não" usou nas suas páginas uma canção minha, para, em ultima análise, promover os seus pontos de vista em relação ao referendo de Domingo.
Para mim, não é um assunto novo. Muitas vezes,cançoes inteiras foram usadas em contextos ampliados—e muitas vezes amplificados. E muitas outras se apropriaram de frases minhas para dizer—e pensar—outras coisas. Goste ou não goste (e gosto várias vezes) acho que tudo isso faz parte de qualquer acto creativo. Se não o quisesse expor a esse risco, guardava-o na gaveta.
Só que há limites, claro.
Desde já, neste caso enganaram-se, não só na intenção, mas no próprio título da canção.
Em vez de "Espalhem a notícia" deviam ter posto (e postado) "Chamem a polícia"...
A minha canção é uma elegia à qualidade da vida, e tambem à alegria consciente de dar à luz um novo ser.
Nada que se pareça com humilhação, falsas promessas de apoio a gravidezes indesejadas, sugestões de trabalho comunitário para substituir penas de prisão, e outra pérolas que tais.
E sim, sim à vida que a canção exalta e reconhece.
Espalhem a notícia.

Sérgio Godinho

Espalhem a notícia.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Ofensivas Camufladas - Manipulação Emocional Parte 2 - O Abominável Senhor Neves - Um Padre Lúcido

1-Nos últimos dias, os movimentos apoiantes do Não no referendo sobre a IVG (pelo menos alguns) têm vindo a defender que, mesmo que o Não ganhe, a lei deve sofrer alterações no sentido de evitar que as mulheres que façam abortos sejam penalizadas, embora estes continuem a ser crimes. Para além da clara hipocrisia que a proposta envolve, há nela implícita uma outra estratégia: procura-se transmitir às pessoas que estão indecisas, ou seja, aquelas que não querem que as mulheres sejam julgadas e condenadas, mas, que ao mesmo tempo, receiam que a IVG se torne uma prática banal, que o voto no Não iria, assim, resolver o seu dilema. Caso a lei viesse mesmo a ser alterada nesse sentido, o voto no Não tornar-se-ía, desse modo, mais apelativo: acabava-se o problema da condenação das mulheres que abortam, mas, ao mesmo tempo, não se caía na anarquia abortiva que muitos ainda temem (um medo que alguns, inteligentemente, continuam a tentar incutir nos eleitores).

Por outro lado, e em clara contra-ofensiva, José Sócrates declara que não mudará nada na actual lei do aborto caso o Não ganhe no referendo. E porque é que digo contra-ofensiva? Porque ao afirmar veementemente tal intenção, o Primeiro-Ministro procura mobilizar os possíveis abstencionistas que até escolheriam o Sim a irem votar. Essas declarações acabam por funcionar como um verdadeiro ultimatum e com uma mensagem muito simples: se não nos mobilizarmos todos, o Sim pode não ganhar e depois não há nada a fazer, pois tudo continuará como dantes.
Esperemos que, para além de simples, também seja uma mensagem eficaz.


2-Sem comentários – os factos dizem tudo: numa escola básica no Cacém, uma mulher não identificada distribuiu um DVD aos alunos, contendo um filme no qual é demonstrado como se faz um aborto. Uma das professoras levou um exemplar para casa e visiou-no, classificando as suas imagens como chocantes. A "Plataforma “Não” Obrigada" fez saber que rejeita este tipo de campanha com utilização de imagens do género dadas a menores.


3-Parece que o paladino da moral pseudo-cristã em Portugal, João César das Neves, defende que a actual lei do aborto devia ser modificada de modo a que as mulheres deixassem de poder efectuar IVGs mesmo em caso de a gravidez ser resultante de uma violação. A pergunta que me ocorre é a seguinte: será que se a esposa de César das Neves fosse violada e engravidasse devido a tal acto ele aceitaria cumprir essa lei de bom grado?


4-O padre Manuel Costa Pinto, depois daquilo que afirmou recentemente (ver http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1285028), ainda me convenceu mais de que na Igreja Católica Romana, uma instituição com milhares de sacerdotes, apenas existem meia dúzia de verdadeiros discípulos de Cristo, sendo que um desses poucos é certamente ele.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

PSD: um exemplo a não seguir.

O Partido Social-democrata chegou ao início da campanha, para o referendo sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, reclamando-se como um partido sem posição oficial. Se dúvidas existiam, sobre a posição que PSD iria assumir no decorrer da presente campanha, essas dissiparam-se com o início da campanha eleitoral.

O PSD está a fazer campanha, de uma forma descarada, pelo não (visionem-se os tempos de antena) e continua a assumir-se «sem posição oficial».

Porque não assumem, os responsáveis do PSD, de uma forma frontal que não são a favor da despenalização da interrupção voluntária da gravidez?

Como contributo para o dignificar o referendo, enquanto instrumento democrático, bem que podiam assumir a sua posição anti-despenalização e deixar de fazer esta campanha pseudo independente onde apenas apresentam argumentos contra a despenalização da I.V.G.

Porquê dizer que o sentido de voto está entregue à consciência individual quando em campanha tudo fazem para influenciar o sentido desse mesmo voto.

Foi esta a forma que o PSD encontrou para fugir a uma derrota eleitoral sem deixar de fazer campanha?

Será esta uma forma digna de abordar o referendo sobre a despenalização voluntária da gravidez?

Algum respeito e responsabilidade são o mínimo que devemos exigir aos que desempenham, ou aspiram a desempenhar, cargos políticos.

Caminhos Vários

A pergunta a que iremos responder no próximo referendo está isenta de moralismos, é certo. Intrinsecamente, não é totalmente possível encará-la como tal. A resposta que iremos dar contém em si todo um conjunto de aprendizagens e de valores que nos foram transmitidos e que buscámos. É por isso que a discussão em torno do referendo acabou por, inevitavelmente, fazer emergir uma série de impulsos que dão origem a opiniões que nem sempre estiveram ou estão bem fundamentadas. Ou seja, de acordo com a realidade.

Se é certo que todos vivemos de acordo com determinados princípios que não são elementos fixos durante a vida que viveremos (mais curta ou mais longa, não importa), também é certo que a reflexão sobre a vida não deve ser feita de modo dogmático. Se formos realistas, se nos sentarmos e reflectirmos com frontalidade, concluiremos que o conceito de vida que defendemos é a de uma vida de acordo com preceitos mas também de acordo com itens que proporcionam bem-estar físico e psicológico. Esse bem-estar não é um ideal romântico, é algo que perseguimos realmente durante o nosso percurso, sejam quais forem os caminhos que sigamos.

Defender a vida é defender uma miríade de vidas que possam usufruir de uma qualidade de vida que não passa unicamente pelos bens materiais mas em que, por exemplo, esses bens podem ajudar a melhorá-la. Defender a vida é defender o acesso a uma educação condigna, enquadrada num ambiente familiar estável e de afectos, naquilo a que se possa dar o nome de lar, onde, por exemplo, uma criança tenha vontade de viver, onde se sinta querida e amada, onde possa brincar, onde possa desenvolver-se com todas as ferramentas que farão dela um adulto saudável em todos os aspectos.

Responder SIM no referendo de dia 11 significa afirmar o direito a essa vida, de uma forma não dogmática. Responder SIM não significa obrigar as mulheres que não querem abortar a fazê-lo. Não significa nem deve significar um incentivo ao aborto. Significa apenas que as mulheres que OPTAM por fazê-lo têm ao seu dispor dois caminhos, duas escolhas. Numa sociedade democrática, é disso que deveríamos também estar a falar.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

Força Mobilizadora

Em muitas situações, são os cidadãos que pressionam, pela sua força conjunta, o poder político para que se mova e avance no sentido das suas ansiedades, das suas necessecidades. Em certos casos, como parece ser o do referendo de 11 de Fevereiro, é o poder político que deve ou deveria assumir-se como móbil dessa transformação. Concordo que sim. Ainda para mais quando o próprio partido do Governo tem feito campanhada em prol da despenalização.
Neste caso - como em muitos outros -, uma força mobilizadora vinda de cima, sem que houvesse necessidade de campanhas demagógicas e manipulações das populações (das mais variadas maneiras) teria impulsionado uma transformação benéfica.
Nesta discussão, como em tantas outras - que não cabe agora desenvolver - bem sabemos como seria benéfica uma alavanca que nos levasse à convergência das mentalidades com a Europa - não por subserviência mas para nosso próprio bem como comunidade aberta e progressista (e nestas palavras não se encontra um único vestígio de ironia mas de optimismo).

sábado, 3 de fevereiro de 2007

Despenalizar a Interrupção Voluntária de Gravidez é tomar a decisão que os políticos evitaram. É não criminalizar as mulheres pela prática de uma I.V.G. É decidir em referendo o que à muito deveria ter sido reconhecido e aprovado em sede parlamentar.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

A Manipulação Emocional: Arma de Campanha

Após a viragem de mais um século, seria de esperar que o Homem estivesse a queimar mais uma etapa no aperfeiçoamento da sua mentalidade, sobretudo no que diz respeito ao comportamento perante o seu semelhante. Porém, se há coisa para a qual servem as campanhas relativas a eleições ou a referendos é para verificarmos o quanto esta esperança parece ser vã. Nestes períodos, em que 0,5% da população, ou seja, aquela percentagem que realmente se mobiliza, passa duas semanas a tentar convencer os outros 99,5% de que as suas ideias é que estão correctas, vale tudo, até mesmo o uso de manipulação emocional.

Ontem, através de um canal de televisão, tomei conhecimento da seguinte notícia: em quatro creches (de uma localidade da qual não me recordo o nome) foram colocados folhetos nas mochilas das crianças apresentando textos claramente em defesa do voto no “não” no referendo sobre a IVG. Esses textos, obviamente destinados aos pais das crianças, foram redigidos como se se tratasse de uma carta escrita por um feto vítima de um aborto à sua mãe desnaturada, questionando-a sobre os porquês que a tinham levado a cometer tal acto. Foram citadas algumas passagens do texto na reportagem, mas, na impossibilidade de me lembrar delas com exactidão, apenas posso dizer que incluíam declarações semelhantes a: “mãezinha porque é que me mataste? estava aqui tão bem a brincar dentro da tua barriga e de repente veio um grande ferro e levou-me”, etc. Segundo o que foi dito, terá sido o padre responsável pelo centro paroquial ao qual pertencem as creches o autor desta brilhante ideia. Claro que isto não seria problema se as populações – e, neste caso específico, os pais das crianças – estivessem esclarecidos. Mesmo votando “não”, não votariam “não” pelas razões sem sentido apresentadas pelo folheto. O pior é que, quando chegou a vez de ouvir as reacções dos pais quando lhes perguntaram o que é que achavam da iniciativa do padre, surgiu a elucidativa resposta de uma das mães: depois de dizer que concordava com o texto, acrescentou qualquer coisa parecida com isto: “se calhar é mesmo assim que o bebé se sente dentro da barriga quando é vítima de um aborto”. Se esta eleitora, detentora, por isso, de poder de voto, estivesse informada, saberia que um feto com dez semanas não pode sentir dor, nem ter consciência, pois não tem sistema nervoso central e o seu cérebro ainda não está completamente desenvolvido.

Este caso remete-nos para a manipulação a que a Igreja sujeita muitos dos crentes por esse Portugal fora, sobretudo nas zonas do interior Norte, mais isoladas, com menos acesso à informação e onde a palavra dos clérigos é lei. O que torna o problema mais difícil de ser combatido é o facto de apelar à parte emocional e religiosa das pessoas. Não é por acaso que foi um padre o autor dos folhetos, nem muito menos, o facto de estes terem sido distribuídos em creches, e logo nas creches dependentes do centro paroquial que este dirige. Procurava-se visar pessoas com filhos ainda muito jovens, que provavelmente tinham sido pais à pouco tempo, e, portanto, com a experiência ainda muito recente de ter cuidado dos seus bebés. Por outro lado, se olharmos para o facto de o autor dos panfletos ser, ao mesmo tempo, o padre daquela paróquia e o responsável pelas instituições onde a população deixa os seus filhos todos os dias (provavelmente de forma gratuita), facilmente compreendemos que essas pessoas acabam por se sentir obrigadas a cumprir, não só as orientações do seu guia espiritual e porta-voz da lei divina, como do homem que zela pelo bem-estar das suas crianças enquanto estão nos seus empregos.

Este acontecimento é apenas um entre muitos. Os movimentos, grupos e instituições que defendem o “não” no referendo sobre a IVG jogam constantemente com o factor emocional, pois não têm bases racionais sólidas nas quais sustentar os seus argumentos. O antídoto está exactamente em não entrar nesse jogo e manter a discussão no campo da razão. Só assim será possível fugir ao sentimentalismo, à demagogia e ao populismo.

Dia 11, vamos vencer a manipulação emocional promovida pelos movimentos que defendem o “não”.
Dia 11, vamos vencer o obscurantismo
Dia 11, vamos votar SIM.

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Porque respondo SIM

Votar sim é a oportunidade de terminar com a criminalização da interrupção voluntária da gravidez (I.V.G).
Esta será a consequência de maior visibilidade no momento de vitória do sim no próximo dia 11. Mas não será a única consequência importante.

Votar sim é permitir ao "outro" cumprir, dentro de um regime de legalidade, com as decisões que toma em consciência. Neste caso é não arrogar o direito de votar para decidir por terceiros numa matéria que é do foro íntimo da mulher, no máximo, do casal.

Acabar com a penalização da I.V.G. corresponde ao fim do véu da ilegalidade que condiciona de forma negativa a decisão. Entenda-se; despenalizar é permitir, à mulher, num momento difícil e de grande fragilidade, recorrer ao aconselhamento médico sem temer o jugo de uma lei que a penaliza criminalmente. Despenalizar é contribuir para uma decisão ainda mais ponderada.

Despenalizar é contribuir, de uma forma decisiva, para o debelar de um problema de saúde pública. Um problema que ganha forma através dos números que todos conhecemos.
A I.V.G. que não é medicamente assistida aumenta o risco de lesões físicas e psíquicas para a mulher. Os casos de morte acontecem e não podem ser ignorados.

A I.V.G. não é um método contraceptivo. Não é um acto leviano. É uma decisão que requer as melhores condições para que possa ser tomada em consciência.

Pequenos Apontamentos: Comunicação Social - Adopção - Consciência

Nas últimas semanas, o país tem vindo a ser bombardeado pelos meios de comunicação social com constantes notícias relativas ao caso do sargento Luís Gomes, o homem que adoptou uma criança, e, vendo-se em risco de a perder para o pai biológico – agora reclamador da sua tutela – resolveu levá-la para paradeiro desconhecido e mantê-la escondida da justiça.

Face à tamanha quantidade de informação disponibilizada sobre o caso, tem-me ocorrido, por diversas vezes, se todo este aparato, exactamente durante o período de pré-campanha e campanha para o referendo sobre a IVG, será por acaso. Claro que havendo ou não havendo referendo, o caso seria, de qualquer forma, tratado pela justiça e falado na comunicação social. Porém, tendo em conta o facto de corresponder a esta fase fulcral da discussão sobre a IVG, pode estar a ser usado para influenciar a decisão no referendo a favor do Não. De facto, a mensagem que passa é a de que vale sempre a pena levar a gravidez até ao fim mesmo que a mãe ou a família não tenham condições para ter uma criança, pois haverá sempre uma “alma caridosa” que tratará dela e a defenderá como se fosse biologicamente sua filha.

É uma verdade que alguns destes casos terminam bem. Não duvido que a filha adoptiva do sargento Gomes esteja em boas mãos. O problema é que esta não é a regra. Nem sequer imagino a quantidade de crianças que aguardam por adopção fechadas em estabelecimentos de acolhimento, muitos deles de qualidade duvidosa, verdadeiras escolas de marginalidade, em todos os sentidos da palavra. Terão que esperar muito tempo e muitos nunca chegarão a ser adoptadas. E, depois? quando passarem daquela idade em que deixam de ser suficientemente “engraçadinhos” para interessarem aos casais que optam pela adopção? O que será deles? Será que é com pessoas destroçadas desde a infância por sentimentos de rejeição, abandono, baixa auto-estima, más condições de vida, marginalidade e muito mais, que se pretende “repovoar” o país como os defensores do Não clamam que é necessário fazer? Ou será que esse objectivo não seria mais bem conseguido incentivando a natalidade entre as famílias estruturadas e capazes de proporcionar um bom futuro às suas crianças?

Os defensores do Não dizem que a sua consciência não lhes permite aceitar que se destrua o que chamam de “ser humano” ao evitar que este se desenvolva e nasça. A minha não me permite aceitar que se destrua um verdadeiro ser humano, com consciência, razão e sentimentos, na tortura lenta e degradante de uma vida condenada à nascença.

terça-feira, 30 de janeiro de 2007

Respondo Sim

«Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?»

Esta é a questão que será referendada no próximo dia 11 de Fevereiro. Sim ou não? Nada mais.

Somos, ou não somos, favoráveis à despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (I.V.G.), se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas? Concordamos, ou não concordamos, que uma mulher que decida praticar uma I.V.G. seja assistida num estabelecimento de saúde devidamente autorizado?
Sim ou não?

O que será alvo de referendo no próximo dia 11 de Fevereiro é uma proposta de alteração ao código penal.

Não será alvo de referendo no próximo dia 11 de Fevereiro nenhuma lei moral.
Estejamos certos disso.

Realidade vs Idealismo

Pegando um pouco na ideia que o Ricardo expôs no seu post anterior, gostaria de focar sucintamente um dos pontos em que todos deveríamos insistir durante e após este período de intensa discussão: prevenção. Este ponto de reflexão tem como objectivo focalizar apenas um dos pontos de vista que estão em discussão. Fala-se bastante em prevenção e em planeamento familiar.

É certo que existe à disposição de muitas mulheres e respectivas famílias toda uma panóplia de elementos que permitem evitar uma gravidez indesejada. Mas também é certo que essa informação não vai ter com essas pessoas, na maior parte das vezes o contacto é feito no sentido oposto, o que pressupõe algum tipo de desejo de obter mais informação a partir do pouco que já se tem.

Sabemos que a falta de informação, conjuntamente com um acesso restrito à escolaridade desejável e com dificuldades prementes de uma vida prática e real, afectam, sobretudo, mulheres e homens que não são totalmente privilegiados.

E aí entra o conflito entre o mundo ideal e o mundo real. Esse tipo de planeamento nem sempre é feito ao mesmo ritmo que a urgência das vidas reais e temos de ter a honestidade de admitir que o recurso à interrupção voluntária da gravidez é uma realidade que, muitas vezes, não conhecemos de perto e que, como tal, preferimos admitir que não é tão grave como isso. Mas é.

Cátia Santos

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

O que está em causa

No referendo que se aproxima rapidamente, estará em causa uma das questões mais basilares para todos os seres humanos desde o despertar da humanidade: liberdade.
Mais especificamente a liberdade de cada mulher, não isolada do meio em que está inserida nem afastada da rede de relações humanas em que se inscreve, poder optar entre ter um filho que deseja ou não o ter porque não pode ou não deseja.

Alegar que a actual lei é suficiente não passará de demagogia e irrealidade. Se for a minha vontade, como mulher que sou, interromper voluntariamente a minha gravidez - não tendo sido violada, nem prevendo a existência de mal-formações do feto - só o poderei fazer recorrendo a meios ilegais. Como uma criminosa, como uma clandestina no meu próprio país, tratada como uma cidadão de segunda. É disso que se trata.

Se existe quem defenda a inconstitucionalidade da nova lei, caso venha a ser aprovada, por atentar contra a sacralidade da vida, que dizer do atentado à vida da mulher? A realização de um aborto nas condições que muitos de nós conhecem - e que eu própria conheço de muito perto - põem, obviamente, em causa a vida da mulher. A negação de cuidados de saúde e de apoio nessa altura a essas mulheres não constitui também um atentado?

É, logicamente, muito difícil para uma mulher decidir-se pelo aborto. Não é algo que se decida de forma leviana e que seja visto como facilitismo. Mas sejamos realistas: a vida prática de muitas mulheres não é um mar de rosas e é a vida prática que é vivida, não o absolutismo de alguns ideais.

Decididamente, não podemos ou não devemos julgar os outros segundo a nossa própria medida, a votação de dia 11 representa também a nossa capacidade de nos deslocarmos do nosso centro gravitacional e colocarmo-nos nas vidas de mulheres (e homens) que, possivelmente, não vivem como nós. E colocarmo-nos na nossa própria vida e sermos honestos connosco.

Cátia Santos

domingo, 28 de janeiro de 2007

Por uma vida que valha a pena viver

Sou pelo “sim” à despenalização da interrupção voluntária da gravidez. É uma questão de defesa da vida, de respeito pelo ser humano. Esta afirmação pode parecer estranha para aqueles que defendem o “não”, mas estou convicto de que corresponde à verdade. Isto porque a vida só vale a pena ser vivida se o for com o mínimo de dignidade, o que é válido, neste caso específico, tanto para as mulheres, como para as crianças. A vida apenas pela vida, pelo simples facto de um coração bater não me parece fazer nenhum sentido.

Permitam-me que me explique melhor. Para mim, só vale a pena trazer uma criança ao mundo se lhe pudermos dar uma vida decente. De outro modo, não vale a pena. Só lhe causaríamos sofrimento, ao qual se juntaria, ainda, a dor da própria mãe e familiares, incapazes de lhe proporcionar as condições de vida ideais. Não falo dos fetos com malformações, pois é uma situação que já está prevista na lei actual, mas das crianças que, se nascerem, terão um destino marcado com a palavra “Miséria”. Para começar, miséria económica, que se encontra quase sempre associada à miséria social: desemprego, exclusão, mau ambiente familiar, habitações precárias, falta de condições higiénicas. Depois, o que daqui naturalmente advém: doença, violência, marginalidade, desinteresse pela educação. A despenalização da interrupção voluntária da gravidez pode salvar muitas crianças de destinos como este e muitas mães de agravarem a sua já precária condição.

Haverá quem diga que estes não são argumentos válidos, pois o Estado devia ajudar as famílias mais desfavorecidas para que as crianças por nascer pudessem ter melhores perspectivas de vida. É verdade que tal devia acontecer, mas para já, é uma proposta destinada a um mundo ideal. No mundo real, em que nós vivemos, e, sobretudo, em Portugal, um país que se debate com sérias dificuldades económicas, isso é impossível. O Estado não tem capacidade financeira para poder ajudar os vivos muito menos os que estão por nascer. É triste, mas é a realidade e é a partir dela que temos que pensar o assunto.

Há ainda quem clame que, se o Estado não pode ajudar essas famílias, porque é que está disposto a gastar dinheiro em abortos? Não nos iludamos. O dinheiro gasto pelo Estado para pagar um aborto, caso fosse entregue às famílias, não daria para suportar os custos de alimentação, saúde, educação, etc, de um filho. Aliás, o custo de um aborto não equivale nem a um dia de despesas na vida de uma criança. Umas quantas embalagens de fraldas e o dinheiro rapidamente desapareceria.

Porém, não defendo a despenalização da interrupção voluntária da gravidez apenas devido aos casos de falta de condições socio-económicas, embora os considere prioritários. Existem mulheres que, tendo uma situação boa ou mediana nesses campos, podem engravidar e sentir que a altura não é a melhor para ter um filho, por razões profissionais ou meramente pessoais. Pode parecer egoísmo, e não duvido que possam existir algumas situações em que o seja, mas se pensarmos melhor, será que obrigar uma mulher que não se sente preparada a ter um filho será benéfico para ele? Não me parece. Muito menos para ela. Raramente um trabalho forçado tem bons resultados.

Mais uma vez é fácil para certas vozes levantarem-se contra afirmações como estas e apresentarem-nos o argumento da prevenção. Estou de acordo com a prevenção. Mesmo que a despenalização da interrupção voluntária da gravidez ganhe, acho que se deve continuar a apostar nela. Todavia, coloca-se aqui, mais uma vez, a questão do mundo real vs mundo ideal. Num mundo ideal, a prevenção resolveria tudo: informavam-se as mulheres, explicando-lhes todos os cuidados a ter e elas cumpririam todas as indicações à risca. Porém, no mundo real, a racionalidade humana facilmente vacila, as emoções do momento nem sempre são controláveis e as coisas acontecem. Se assim é, o que fazer quando acontecem? Já vimos anteriormente que ter um filho e esperar por ajudas estatais ou outras não é a solução. A interrupção voluntária da gravidez é a solução quando tudo o resto falha, apenas quando tudo o resto falha e, como todos sabemos, falha muito.

No fundo, penso que o que está em causa neste referendo podia ser resumido à expressão “defesa da vida”, mas à defesa de uma vida com direitos, com dignidade, com felicidade e com oportunidades para mulheres e crianças, contra os que defendem a mera vida pela vida, a vida sem sentido, sem futuro.

No referendo da interrupção voluntária da gravidez devemos votar “sim”, por uma vida que valha a pena viver.

Por um voto pelo SIM.

A proximidade do início da campanha para o referendo do próximo dia 11 de Fevereiro exige a mobilização de todos, sem excepção, de modo a que a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez (I.V.G.) seja uma realidade.
A clandestinidade em que é feita a I.V.G tem de acabar. Esta ilegalidade tem de terminar.
Não podemos continuar a permitir que num momento de sofrimento as mulheres se encontrem privadas da devida assistência médica, sendo a face, por todo o país, de um problema de saúde pública que urge resolver. Que temos a obrigação de resolver! Porque aquilo que é um direito encontra-se, neste momento, sonegado por uma lei que tem de ser revogada e que apenas silencia o sofrimento de quem é alvo desta discriminação.
Este é o momento de votarmos contra a hipocrisia que representa a criminalização das mulheres que fazem uma I.V.G.
Esta é, também, uma questão de respeito pelo outro. Respeito pela capacidade de cada um decidir, em consciência, o que entende ser melhor. Votar sim é contribuir para que o outro tenha autonomia legal para decidir. É contribuir para que muitas mulheres tenham direito a dignidade.
Por tudo isto, é dever de todos os que defendem a despenalização da I.V.G. colaborar para a mobilização dos partidários do SIM em busca de um resultado no referendo que, finalmente, consiga proporcionar a dignificação completa da vida da mulher e da criança.

Desta vez não podemos faltar.

PELO SIM.


Cátia, Jorge, Ricardo.